Como surgiu a ideia e o nome do Molusco? Era seu apelido?
Diferente do que muitos pensam, esse apelido não surgiu na roda dos amigos de infância, surgiu no meu primeiro emprego. Tinha acabado de ser contratado na como diretor de arte jr, na Artplan e tentava conciliar a vida de novo trabalhador sério e responsável com as noitadas frenéticas que rolavam praticamente todos os dias da semana com exceção dos domingos (que servia para ficar de molho, recarregando a bateria). No terceiro mês nessa batida, minha aparência lembrava Tom Hanks no Náufrago. Como as festas roquenrol rolavam sempre na zona sul, e eu, morador da zona oeste (Sulacity), resolvi engatar a noitada no trampo, que era na Lagoa. Péssima ideia, virei realmente um espécie mendigo assalariado. Os amigos que sempre chegava no trabalho e me cumprimentava com um: -E aí maluco, beleza? Tiveram que adaptar, devido minha aparência, para: -E aí Molusco, belesma? E aí foi ficando, ficando e ficou.
Como você chegou no tempo de 20 minutos?
Sempre falo que uma história tem que durar o tempo necessário para deixá-la boa. Boa em ritmo, em viradas, em graça, em trama. O tempo é metafísico, e muitas coisas curtas, parecem uma eternidade e coisas longas passam voando. Nunca predefini um tempo padrão, uma grade. Eu simplesmente escrevo e paro quando acho redondo…. Acontece que ao contar contos canábicos, eu percebi que existe um tempo que é particular da chapação. Se eu conseguir segurar a pessoa nesse tempo, eu potencializo a experiência… Então tento sempre me manter entre 15 e 40 minutos (duração de uma sardola palha e de uma sardola power). O legal que casou com meu jeito prolixo de contar um conto, casamento espontâneo.
Qual é a parte mais difícil? Concepção, criação, roteiro, personagem, captação, edição, pós produção, sonorização e administração das mídias sociais e divulgação?
Tudo é uma puta sofrência e exige habilidades distintas. Sempre achei muito maluco essa onda de fazer tudo sozinho, mas creio que esse movimento vem da minha incapacidade de envolver as pessoas. Quando conseguia, a agenda desandava. De todas as habilidades de concepção e finalização, a única que não tinha experiência (lá atrás, no início) era o roteiro. Passei minha vida toda “layoutando” coisas, sempre fui de imagens e quase nunca de escrita. Mas ao me deparar na falta de um roteirista para adaptar meus contos, só me restava escrever. Acreditava que era capaz, era alfabetizado e conhecia as histórias. Por que não? Foi todo um processo de autoconhecimento, de tentativas e erros, até entender que podia modelar uma estética peculiar, um formato peculiar, pois tudo era adaptado para ser executado por uma pessoa. Exemplo disso é o tipo de enquadramento que uso nos contos. Sempre planos fechados, muitos closes, nunca corpo inteiro. Por que isso? Pra preservar meu shape de pão que queijo? Não, isso é por conta da distância que tenho para regular o foco, que é a distância do meu braço. Sozinho, eu não teria como me posicionar longe e focar. Aí você faz isso 20 vezes e vira linguagem, mas no fundo é o que dá pra fazer.
Cada etapa merece uma atenção específica. Como aprendi a me virar em todas, não sei o qual é a mais difícil. Sei que o ouro está no roteiro. Ele é a matriz, que me permite desdobrar para várias mídias (video, livro, quadrinhos, animação), mas as outras partes moldam e expõe minha visão. Editar ficção é a chance de reescrever um roteiro. Então é a uma puta oportunidade de melhorar a história, o ritmo, colocar “inserts” que agregam. Lembrando que faço isso num mini estúdio com um pano azul, onde muito do clima, depende de uma pós produção minimamente pensada. Enfim, acho que criei um método próprio para executar meus contos, que me satisfaz. E essa coisa autoral não pode ser desassociada, é o conjunto da obra. Mas respondendo sua pergunta, todas as etapas dariam para terceirizar, caso precisasse, com exceção do roteiro. E essa sem dúvidas, gera dor de um parto. Sofro como poucos.
Por falar em roteiro, a parte irônica é que assim que comecei a escrever, me via apenas como diretor de arte, e um ano após, me de descobriram como roteirista. Fui trabalhar na Conspiração e pausei por completo os trabalhos de direção de arte. Hoje trabalho escrevendo séries e filmes.
Com relação as mídias sociais, isso era a última coisa que conseguia pensar, portanto sempre foi muito zoado. De um ano para cá, pude contar com a expertise de um social media profissional (Daniel Ramos) que me ajudou a dobrar os seguidores do Instagram, criando uma rotina interessante de posts que atenda ao público.
Qual limitações você sofreu nesses 9 anos? (No começo o Moluscontos trazia musica de qualidade durante as histórias…)
Pois então, no início não tinha pretensão alguma de ganhar grana com o canal. Ele surgiu de uma necessidade de desopilar e por conta disso, nunca me atentei para algumas questões, como músicas comerciais. Sempre achei do caralho poder contar uma história e ambientar ela com as músicas que fizeram parte do conto. Aliás, música é algo que sempre esteve presente na minha vida, quase sempre estou ouvindo um som (como agora, enquanto escrevo, tô ouvindo uma versão de Close to me do the cure, muito foda, tocada num jazz folk maluco). E eu lembro muito bem das músicas nas situações mais bizarras. Então por que não colocá-las? Até porque eram músicas dos anos 90 e a geração que hoje assiste o conteúdo muitas vezes nunca ouviu um Pixies, ou Sonic Youth e tal. Achei que tivesse levando um pouco de cultura e divulgação, mas as raposas que sentam no baú de dinheiro fonográfico, acham que estou enriquecendo às custas das bandas. Por conta disso, tive meus videos banidos e resolvi abrir um novo canal para usar música royalt free, tipo aquelas que se escuta nos elevadores.
Quais são os contos que mais marcaram a vida do Molusco?
Todos tiveram momentos marcantes. Os primeiros, como A GOTA, MALDITOS ARQUITETOS e AVENTUREIROS são especiais, pois já contava esses contos antes mesmo de passar para o papel. Isso é uma característica que trago, sempre contei as histórias para os amigos. Todo aniversário e churrasco terminava com essas histórias. E mesmo que as pessoas já tivessem escutado dezenas de vezes, pediam para ouvir de novo, coisa de doidão. E eu ia lá e contava de novo.
O Molusco já tem uma legião de fãs né? Qual foi o presente mais massa que você já recebeu?
As artes que me mandam, são sempre muito legais. Fico imaginando o tempo da pessoa ao executar um desenho, um grafite ou uma pintura. Outro dia encontrei um fã que estava no Rio e ganhei um vinil do Ray Charles, achei foda! Sou muito grato pelo reconhecimento e carinho da galera e mais grato ainda por não ter haters.
Nós vimos na internet que um fã fez comic book do Molusco, há chance de vermos um quadrinho com os contos em breve?
Isso é um processo lento, mas esse semestre lançaremos um livro com 20 contos do Molusco. Um projeto gráfico impecável, com 260 páginas e diversas ilustrações do mestre Leandro Assis. Esse vai ser o primeiro passo da MolusComix, e se tudo der certo, iremos voltar o olhar para conteúdos literários e quadrinhos com essa pegada canábica. Boto muita fé nesse livro, que será o primeiro volume de contos. Irá rolar um apoio coletivo (catarse) e temos ideia de lançar as histórias em quadrinhos em breve. Como as coisas acontecem sem grandes investimento, administrar o tempo e a ansiedade é fundamental. Minha sorte que conto com a experiência de Sandro Gomes (Lobo), nosso editor faixa preta, terceiro dan de conteúdos undergrounds e quadrinhos de alta qualidade. Vamos ver.